sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

E por falar em saudade...

Uma década. Dez anos de ausência. Nesta sexta-feira, dia 18 de fevereiro, é dia de lembrar de maneira mais forte de Anatália de Abreu Campos. Há exatos dez anos, a vovó nos deixou. De lá pra cá, muita coisa aconteceu... Formatura, casamento, separação, trabalhos, conquistas, desafios e alegrias. Mas também muita, muita saudade!

A vovó era dessas mulheres fortes. Ás vezes vejo a presidenta Dilma e me assusto com tanta semelhança – tanto física, quanto de postura. Mas antes de tudo, a vovó era uma mulher com um coração enorme e uma grande visionária.



Há uns anos, quando a vovó ainda era viva, um texto da Tia Glaucia foi publicado no Jornal O Povo. Pra mim – e pra quem teve a honra de conviver com ela – traduz bem sua história de fibra.

O lindo sonho de Isolda

Tive a sorte de ser amiga de uma jovem chamada Isolda, que vivia no interior do Ceará, em um pequeno sítio denominado Jenipapo, área serrana de Maranguape. Todos admiravam Isolda por seu caráter forte e pela determinação em realizar seus sonhos. Casou-se cedo, com Antônio, com quem teve três filhos: Elizabete, Júnior e Luísa. Isolda desdobrava-se cuidando dos afazeres domésticos ajudando o marido na pequena mercearia e buscando dar a melhor educação para os filhos.

Ao mesmo tempo, exercitando um talento nato para artes manuais contribuía para a renda da família dedicando-se à produção de bordados, costuras e pinturas em tecidos. Mais tarde, Isolda teria seu próprio negócio. Minha amiga parecia ser feita de ferro. Não se cansava nunca e, aos olhos dos demais, era como se seu dia fosse mais longo e produtivo.

Os dias foram passando e os filhos de Isolda e Antônio já estudavam na escolinha que funcionava na casa dos pais dela, sítio Deus-me-livre. O sacrifício era grande. O trajeto – cerca de 4 km – era feito a pé ou, eventualmente, no lombo de animais. A filha mais velha se responsabilizava pelos irmãos mais novos, sob mil recomendações de cuidados.

Com o tempo, a escolinha rural já não atendia as necessidades de estudo de seus filhos. Um dia, presenciei Isolda falando para o marido: “Antônio, temos de mandar esses nossos meninos estudar na capital. Temos parentes por lá. Com certeza quebrarão nosso galho. Aqui eles não serão nada. Lá, estudando, eles se farão doutores. A gente mata as saudades nas férias.”

Meu amigo Antônio empalideceu e ficou a pensar dias e noites, remoendo sobre como seria ficar sem os três filhos. Dotado de grande sensibilidade para as coisas da vida, já intuía a perda definitiva dos filhos, fato que geralmente se segue a separações prolongadas. Isolda não desistia de sua idéia e insistia com o marido: “Antônio, esses meninos não podem ficar aqui. Quero que eles continuem estudando e progredindo. Aqui não tem futuro.”

Para Antônio era difícil decidir. Além de ficar longe dos filhos, que tanto amava, pensava no apoio que poderia vir, de seu único filho homem, para ajudá-lo nas tarefas do pequeno comércio, ou até mesmo tocando alguma plantação.

Isolda não queria nem ouvir falar nesta possibilidade. Presenciei, mais de uma vez, sua firme convicção, discutindo com o marido: “homem, tu não vês a minha dor? Tu bem sabes o quanto me dói ficar, também, distante dos meus filhos, sem dar amor, carinho e proteção. Mas não é só isso que eu quero para eles. Um dia, quando estiverem crescidos, irão entender e agradecer nossa decisão. Com certeza, vão compreender nosso gesto de amor. Vamos sofrer com a separação, mas o objetivo é mais importante: dar a eles educação e possibilidade de uma vida melhor do que a nossa.

Antônio concordou. Os meninos – como eram chamados – passaram a morar na casa de parentes, em Fotaleza. Minha amiga assumiu mais um encargo, que cumpria com muito prazer: ir, uma vez por mês, à capital, acompanhar o progresso dos filhos. Na realidade, o interior não era apenas limitado para os meninos. Depois de alguns anos, e a custa de nova investida confiante e insistente de Isolda ela e o marido, também, vieram morar em Fortaleza.

Durante um largo espaço de tempo perdi contato com meus amigos. Um dia resolvi fazer-lhes uma visita. Fui chegando e já Isolda vinha com os braços abertos e um generoso sorriso de boas vindas, contando notícias sobre o progresso dos filhos: “Amiga que prazer te ver. Tenho muitas novidades para te dizer. Meus filhos estão todos casados. E o melhor, todos se formaram. Elizabete concluiu o Padagógico, mas destinou-se ao comércio e ao campo da estética. Puxou aos pais.  Júnior estudou para advogado, se formou e vai indo muito bem. Luísa terminou a Faculdade de História e está na Secretaria de Educação do Estado. Enfim, todos seguiram seus caminhos. A renúncia foi grande, você bem conhece nossa história. Agora, amiga, me diga: de que posso reclamar da vida? Me realizei como mulher. Tenho um grande companheiro de jornada. Três filhos maravilhosos. Me sinto a melhor mãe do mundo e, principalmente, sinto ter realizado todos os meus sonhos. Se você não sabe, sou avó e estou confiante que meus netos terão melhores oporunidades.” Rimos muito, nos abraçamos e a conversa seguiu como nos velhos tempos.

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Hoje, 09 de maio de 1999, estamos reunidos comemorando o Dia das Mães e, como em outras oportunidades, sempre me vem a lembrança desse exemplo de mulher companheira e mãe trabalhadora. Passando em revista a trajetória de Antônio e Isolda, é inevitável a alusão ao lugar comum: “Atrás de um homem bem sucedido existe sempre uma grande mulher”. Aliás, quando disse isso, ao Antônio, na presença de filhos e netos, ele concordou com a cabeça e dirigiu um olhar carinhoso de agradecimento para sua Isolda. Ela, simplesmente, sorriu. Estava muito feliz.


Um comentário:

  1. Post merecido... O que mais sinto falta é quando lembro dela sem querer assumir que estava morrendo de rir mas com barriga pulando... E as nossas férias no Parque São José? Inesquecíveis! MUITA SAUDADE

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